Para entendermos o conceito que Platão tinha sobre a arte é necessário, antes de qualquer coisa, fazermos um recorte para entendermos a sociedade grega dos séculos IV e III a.C. A sociedade grega é considerada o berço da civilização ocidental. Dela herdamos várias características, incluindo o modo de pensar ocidental. Durante o ápice da civilização grega antiga surgem as chamadas cidades-estados e com elas a protodemocracia.
Embora o senso comum credite a esse período o nascimento das instituições democráticas é importante ressaltar que apenas eram considerados cidadãos os senhores de posse, mulheres e escravos não tinham direito de voto para os conselhos que dirigiam a cidades. Isto se dava porque para os gregos do período helenístico qualquer pessoa que executasse um trabalho manual era considerado inferior.
Para exemplificarmos, basta lembrar que tanto Platão quanto Aristóteles consideravam mulheres e escravos inferiores e deveriam estar subordinados aos seus senhores: os homens de posse. Sendo assim, já na sociedade grega podemos encontrar o conceito de classes sociais bem definidos. Muito disso ocorria porque os gregos acreditavam que o estado de perfeição se dava somente no mundo das idéias. Tudo que ocorre no plano físico é apenas uma cópia imperfeita de algo perfeito existente apenas no plano metafísico.
Se o belo, no nível inferior próprio da arte, consta da imitação ou da representação do que existe no mundo das sombras, qualquer imitação do que é passional, caótico, turvo ou malvado deve ser reprovada. (Platão, República, p. 58).
Podemos assim compreender porque Platão faz uma dura crítica à arte e aos artistas. Platão irá chamar os artistas de imitadores, e criticará aqueles que apreciam as obras de arte. Os que contemplam a arte ficam cegos pela ilusão da perfeição, sendo que esta só ocorre no plano imaterial. Se Platão fala que o mundo que enxergamos é apenas uma ilusão, uma cópia do real, então os artistas são os que mais se iludem pelo reflexo do real e sua arte será apenas uma cópia de uma cópia. Se para Platão as pessoas deveriam ser e agir de acordo com a racionalidade então os artistas e apreciadores da arte estarão em um nível inferior de humanidade, pois são os que mais se prendem às ilusões e emoções.
“Podes dizer-me o que seja na verdade a representação (mimeses)? (...) Nós fixamos em geral um só conceito para muitos objetos, aos quais damos o mesmo nome (...) Não é nosso costume dizer que os fabricantes destes móveis, tendo em mente o conceito, fazem, uns as camas e outros as mesas de que nos servimos, e assim todas as outras coisas? O próprio conceito não é fabricado por nenhum desses artesãos, como poderia sê-lo? (...) Bem, disse, tu captas o sentido do discurso como convém. De fato, um desses artesãos é precisamente o pintor” (Platão, República, p. 58).
Para Platão a arte em sua forma utilitária era a única que possuía um pouco de valor real. Por exemplo, quem projetava uma casa estava mais perto do ideal de perfeição do que o artista que a representava em uma pintura.
O LEGADO PLATÔNICO DE ARTE
As idéias de Platão influenciaram muito o modo de pensar ocidental. Durante a Idade Média podemos perceber a influência do pensamento platônico no modo de conceber a arte. Os motivos religiosos marcaram a arte cristã desse período, pois somente os motivos divinos eram considerados próximos da perfeição de Deus.
Mas não somente a Idade Média será influenciada pelo pensamento platônico de arte. Muito do senso comum sobre a arte e os artistas vem da forma platônica de avaliar a utilidade da arte. Se hoje os trabalhos manuais e os artistas são relegados a uma classe inferior muito disso se deve a forma grega e platônica de pensar. Não que o pensamento platônico esteja totalmente errado, o conceito de ilusão de Platão se encaixa muito bem ao contexto atual. A arte pode sim servir como ilusão, como forma de ludibriar o espectador. Para tanto basta lembrarmos do show midiático, da TV e em muitas vezes até mesmo o cinema e a literatura comercial.
Devemos lembrar também do caráter utilitário a favor do mercado que a arte assume hoje. Nos dias atuais quem define o que é arte? Quem define o que pode ser exibido nos museus e nas galerias de arte? Se a arte é fruto do seu tempo, passamos por um período em que a arte serve como produto. E como produto a arte também pode servir como fator alienante. Mas daí a considerar toda forma de manifestação artística como alienadora é um grande erro.
Se na época de Platão a arte assumia um caráter utilitário, hoje ela pode servir como uma forma de expressão. Basta lembrarmos o “lendário” ataque de pichadores à faculdade de belas artes em junho de 2008 em São Paulo (http://renatasim.wordpress.com/2008/06/12/arte-como-crime-crime-como-arte).
Através da arte pode-se dizer o indizível através de palavras. Assim, a definição de arte atinge um outro sentido. Podemos então dizer que o artista possui, além das formas tradicionais de comunicação humana, a sensibilidade como forma de expressão.
*Newton Benetti é formado em História e graduando em Filosofia pela Universidade Estadual do Norte do Paraná, Campus CCHE e Profissional recem formado do Projeto Diálogos Sociais, Cultura e Democracia.
Referencial Bibliográfico:
BEY, Hakim. Caos / terrorismo poético & outros crimes exemplares. São Paulo: Conrad, 2006
PLATÃO. A República. São Paulo: Hemus